Projeto da deputada Erika Hilton pede anistia para todas as mulheres condenadas pela prática de aborto; ‘Não podemos ter vergonha de colocar isso em pauta’

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A prática do aborto no Brasil é legal em apenas três hipóteses: quando a gravidez é resultado de estupro; quando há risco de morte para a gestante; ou quando o feto é diagnosticado com anencefalia.
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Por isso, um projeto de lei de autoria da deputada federal Erika Hilton (Psol-SP) que anistiar todas as mulheres que praticaram aborto em situações consideradas ilegais, conforme o Código Penal.

A matéria em questão é o projeto de lei (PL) 820/2025 que atualmente se encontra na Comissão de Defesa dos Direitos das Mulheres da Câmara dos Deputados para ser relatado. De acordo com a matéria, seria anistiada todas pessoas acusadas ou condenadas pelos crimes de aborto em razão das violações ao direitos fundamentais e direitos sexuais e reprodutivos que cada cidadão tem como garantia.

O projeto é polêmico e deverá encontra resistência na Casa, mas, mesmo assim, a princípio, ele tramita em caráter conclusivo, isto é, caso seja aprovado nas comissões da Câmara – ele ainda precisará passar pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania – e do Senado, a matéria não precisará ir a plenário.

Em entrevista à CNN, em março deste ano, a deputada disse reconheceu que a matéria trata de um assunto que divide opiniões, mas ressaltou que mesmo assim é preciso “pautar o debate sobre os direitos de todas as mulheres. Antes que pautem o fim de todos eles [direitos]”.

“Não podemos ter vergonha de colocar isso em pauta. Pois aqueles que, em toda legislatura, pautam projetos misóginos e odiosos, estão por aí, orgulhosos dos horrores que produzem”, afirmou Erika Hilton.

Proposta

Para entender a natureza da proposta da parlamentar, é preciso, antes, entender o contexto no qual o Brasil está inserido em relação ao aborto. Para isso, o próprio PL da psolista, traz em seu bojo uma série de dados que justificam a iniciativa da deputada que visa anistiar pessoas que foram acusadas, processadas, condenadas ou que estejam cumprindo pena, restritiva de direitos ou privativa de liberdade, em razão da prática do crime de aborto tipificados nos arts. 124 e 126 do Decreto Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940.

Pelo projeto da deputada, a anistia será concedida àquelas mulheres que tiveram em qualquer fase do inquérito policial ou instrução criminal acusação baseada em provas obtidas de forma ilegal, incluindo a violação do sigilo médico ou profissional. Além disso, o texto também garante que anistia às crianças e adolescentes, que tenham praticado conduta análoga ao crime de aborto, ficando extinta quaisquer medidas socioeducativas decorrentes.

A anistia, diz o projeto, poderá ser solicitada pela defesa da vítima ou então pela Defensoria Pública, pelo Ministério Público, ou pela própria pessoa condenada ou por terceiros.

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crédito: Poder 360

 

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Dados

Para chegar à conclusão de que a anistia em casos de aborto é um direito fundamental da pessoa humana e precisa ser garantido, a deputada Erika Hilton utilizou-se de diversas pesquisas, sendo, uma delas, o estudo “Aborto e raça no Brasil, 2016 a 2021”, que analisou dados com perspectiva racial da Pesquisa Nacional de Aborto, realizada entre os anos de 2016, 2019 e 2021. Neste estudo, ficou comprovado que os percentuais de aborto entre as mulheres negras são mais elevados do que entre as mulheres brancas.

Além disso, segundo a Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, 60% das mulheres processadas por abortarem sozinhas em casa ou com ajuda de alguém no Rio de Janeiro são negras; 75% são solteiras; e 65% têm outros filhos e nenhuma mulher possuía antecedentes criminais na época do aborto. Outro cenário analisado, foi em São Paulo, onde a Defensoria Pública também constatou que 47% das mulheres processadas na região eram negras; 53% já possuíam filhos; e 67% eram solteiras e todas eram rés primárias, com bons antecedentes.

Outro estudo, esse feito pelo Instituto de Estudos da Religião (ISER), mostrou que, em São Paulo, uma adolescente que buscava obter acesso ao aborto legal após sofrer uma violência terminou com a abertura de uma investigação contra a médica que a atendeu em um hospital de referência para violência sexual, por denúncia do Conselho Tutelar.

Com base nesses dados, fica mais fácil entender o Relatório “Aborto no Brasil: Falhas Substantivas e Processuais na Criminalização de Mulheres” que analisou 167 decisões judiciais e constatou que “as mulheres processadas por aborto no Brasil são muitas vezes condenadas com base em provas tênues e juridicamente insuficientes (por vezes obtidas de forma ilegal), em julgamentos em que podem enfrentar estigma e preconceito por parte de promotores, promotoras, juízes e juízas, e raramente de entram com recurso contra sua detenção ou sentença”.

O mesmo ocorre com os médicos a quem as mulheres recorrem para fazer o aborto, que, segundo o relatório, são as mesmas pessoas que as encaminham à polícia e testemunham contra elas no julgamento.

 

Mesmo assim os casos de aborto no país não param de ocorrer. Outro relatório, desta vez feito pela Universidade de São Paulo (USP) de Ribeirão Preto, mostrou que entre 2018 e 2022, houve uma média de 400 novos processos judiciais relativos a autoaborto (artigo 124) ou aborto consentido (artigo 126), por ano, no Brasil.

O relatório da USP está baseado em dados estatísticos disponibilizados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que constatou que os estados brasileiros com os maiores números de novos processos no entre os anos de 2018 e 2022 foram São Paulo (201), Minas Gerais (136), Rio de Janeiro (135), Bahia (79), Santa Catarina (77), Mato Grosso (71) e Pará (54). Já os estados com os menores números são: Alagoas (3), Amapá (3), Ceará (5), Rondônia (6), Maranhão (7) e Espírito Santo (8).

Crédito: Revista Oeste

Justificativa

A deputada Erika Hilton embasa sua proposta no fato de que O Brasil é signatário de todos os principais tratados de direitos humanos, como a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW) e a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra as Mulheres. Desta forma, lembra a deputada em seu projeto, a concessão de anistia às pessoas criminalizadas pelo aborto deve ser concedida por lei editada pelo Congresso Nacional.

“A lei que criminaliza o aborto viola as Leis de direitos humanos e podem violar ainda mais as obrigações dos Estados de garantir que mulheres e meninas tenham acesso equitativo a cuidados de saúde reprodutiva e outros cuidados de saúde, sem discriminação”, diz a deputada na justificativa de seu projeto.

Ainda segundo a deputada, no Brasil e no mundo, não deve haver mulheres, meninas e pessoas que gestam presas e nem mortas. “É preciso avançar na descriminalização do aborto no país e compreendemos que a anistia política de todas aquelas que foram criminalizadas por sua capacidade de gestar é um passo importante para a reparação dessa violação dos direitos humanos que acontece no país”, conclui a parlamentar.

 

 

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